JUSTIÇA TRABALHISTA E O ADVOGADO EMPREGADO

Moda agora entre os advogados associados é, ao serem demitidos dos escritórios em que trabalham, ajuizar reclamatória pleiteando vínculo de emprego. E mais, costumam ganhar.

Mais uma vez a Justiça do Trabalho se posiciona de maneira excessivamente protetora ao lado do empregado, acima da lei, o que não tem fundamento, ainda mais no caso em apreço.

Tem-se, inicialmente, que o advogado é uma pessoa que cursou a faculdade de direito e ciências jurídicas por, no mínimo, cinco anos e, após formar-se bacharel, teve que ser aprovado em um exame da Ordem cada vez mais difícil, desafiador e extremamente seletivo para então poder assumir sua profissão.

Este fato, por si só, demonstra que o advogado é uma pessoa preparada e dotada de conhecimento. Logo, ao ser contratado como associado em um escritório de advocacia, tem ciência de que não irá trabalhar sob as normas celetistas e tem total e absoluta capacidade para discernir se isso é ou não positivo para ele. Afinal, caso tenha interesse em se submeter à norma consolidada, pode optar por trabalhar no jurídico de empresas ou qualquer outro cargo como advogado empregado, ou ainda em escritório que o contrata como celetista, com as obrigações decorrentes.

O que acontece, no entanto, é que o advogado prefere laborar alheio às normas da CLT, pois com isso possui uma maior flexibilidade ao longo de seu contrato, não precisando “bater ponto” ou estar diretamente subordinado ao seu chefe, podendo exercer sua capacidade intelectual livremente, mas claro, dentro de regras, senão trabalharia de forma autônoma.

Veja que o próprio advogado escolhe assumir essa função, uma vez que não só irá desfrutar da tão sonhada flexibilidade e liberdade intelectual, como também aproveitará o nome de uma banca já consolidada e os clientes já captados por ela para realizar seus serviços, eis que cada vez mais difícil está o mercado de trabalho nesta área. Sem contar com a estabilidade financeira que não teria como autônomo.

O que é absurdo é que, após essa decisão pensada e tomada em benefício próprio, o advogado, quando finalizado seu contrato, não se conforme e aproveite da engessada Justiça do Trabalho para alegar que sempre trabalhou sob as normas celetistas, utilizando-se do tão importante princípio da primazia da realidade para fazer ludibriar essa justiça ao alegar que foi injustiçado, merecendo, portanto ter seu vinculo reconhecido como empregado.

Ora, isso não se pode admitir. Não é o advogado um trabalhador humilde e sem oportunidades na vida, que acaba por ser explorado pelas grandes empresas, pois precisa de um mínimo que garanta a sua sobrevivência. Este sim deve ser protegido pela justiça. Mas aplicar esta tutela de maneira desmedida e igualmente ao advogado chega a ser uma afronta com aquele que realmente necessita deste acalento!

Mas repare que não são só os estudos e o conhecimento ou até a mesmo a situação financeira que diferenciam o empregado que precisa de proteção do advogado. Há que se analisar o trabalho do associado sob a própria ótica dos requisitos celetistas que ensejam o vínculo empregatício. Isso porque muito se confunde entre estes e o mínimo de organização necessário para que um escritório de advocacia funcione corretamente. Senão vejamos.

É certo que o advogado sempre será pessoa física e atuará em troca de uma contraprestação, tanto é que a onerosidade está prevista no Código de Ética da OAB, requisitos, porém, que não são suficientes para caracterizar o vinculo empregatício.

Quanto à pessoalidade, em que pese o TST entenda que a possibilidade de substituição de um advogado por outros que integrem o mesmo escritório não descaracterize este elemento, tenho que discordar. Ora, a pessoalidade diz respeito exatamente à infungibilidade do trabalhador. Ainda mais quando se trata de advogado, no qual o caráter intuitu personae é tão evidente que se consubstancia no próprio Código de Ética, art. 15, p. 3º, que trata da especificidade das procurações.

Se mesmo diante do caráter personalíssimo da advocacia, decorrente da própria natureza da atividade intelectual, o advogado pode ser substituído por outro na prestação de determinado serviço, por óbvio que o requisito da pessoalidade restará descaracterizado.

Ademais, ainda que em determinados casos estratégicos não haja possibilidade de substituição, este elemento, ainda que presente, não é determinante de uma relação de emprego.

Quanto aos demais requisitos – habitualidade e subordinação – para que um escritório de advocacia funcione, há algumas premissas mínimas, tais como advogados nele trabalhando e um conjunto de regras estipuladas pelo titular, pois somente assim conseguirá subsistir.

No que tange a habitualidade, é claro que o advogado associado precisa, em algum momento, estar presente no escritório que trabalha, seja para lidar com o sistema específico de cada cliente, com os arquivos salvos no computador da empresa e até mesmo para trocar ideias com os demais associados. No entanto, isto por si só não caracteriza habitualidade, uma vez que a sua falta, por exemplo, não precisa ser justificada e não há sequer controle de ponto para medir essa presença.

É natural, no entanto, que o titular do escritório exija um mínimo de comparecimento e dedicação constante a uma atividade de trabalho, pois caso contrário o advogado estaria trabalhando sozinho e não associado a uma empresa e se beneficiando de toda a estrutura, física e intelectual, que ela oferece. Há que se falar ainda, que se ele trabalha em um escritório, mas realiza todo o trabalho em casa, adentra-se nova modalidade de labor, o teletrabalho, que possui um conjunto de regulamentações próprias.

Já o tema subordinação é bastante controverso. Uma vez que os elementos caracterizadores do vinculo devem estar presentes de forma cumulativa, ainda que os acima elencados se concretizem, a subordinação será determinante para a existência ou não da relação de emprego.

É certo que o advogado, mesmo atuando como associado em um escritório, trabalha segundo seu modo de agir e sua convicção, pois é ele diretamente que elabora suas peças, que se faz presente em audiências, que lida com os clientes e que cria teses de defesa ou de ataque.

Não há interferência dos demais advogados ou do titular do escritório nem nos meios e nem no resultado de seu trabalho. O exercício da advocacia, por si só, requer uma certa autonomia e liberdade, eis que a decisão de ajuizar alguma ação ou encetar algum negócio jurídico pode ser do titular, mas a realização é ato profissional exclusivo de cada advogado que lá trabalha.

O escritório de advocacia, no entanto, é uma empresa e não há como subsistir sem que algumas regras sejam seguidas. Sendo assim, qualquer advogado a ele associado deve atuar nos conformes dos princípios e diretrizes estabelecidos pela advocacia em que escolheu laborar. Caso contrário, mais uma vez, escolheria optaria por ser autônomo, mas assim não o fez porque ciente de que se beneficiaria do que o escritório tem a oferecer.

Frise-se que este fator organizacional é importante principalmente para o advogado associado, eis que quanto mais estruturada e coordenada é uma empresa, mais confiável perante seus clientes e maior a sua carteira, o que significa um maior reconhecimento e contraprestação para o próprio associado que lá trabalha.

Dessa forma, ao optar por laborar não como autônomo, mas como associado a um escritório de advocacia, o advogado aceita se submeter à algumas regras, mas, em contrapartida, recebe inúmeros benefícios, inclusive clientes que não teria se trabalhasse por conta própria.

Tendo em vista que há uma reciprocidade de ganhos entre o escritório de advocacia e o advogado associado, a Justiça do Trabalho precisa analisar com outros olhos esse tipo de contratação, que não só é benéfica para ambas as partes, mas também é permitida pelo art. 39 do Regulamento Geral da Advocacia abaixo transcrito, com expressa previsão de ausência de vínculo:

Art. 39. A sociedade de advogados pode associar-se com advogados, sem vínculo de emprego, para participação nos resultados.

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