Jurisprudência

Jurisprudência – Consequências Jurídicas – Construtora Que Entrega Imóvel Com Vícios de Construção

contrutora que entrega imóvel com rachaduras, trincas e defeitos

Jurisprudência – Consequências Jurídicas – Construtora Que Entrega Imóvel Com Vícios de Construção

Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2021.0000097041

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1004156-92.2018.8.26.0451, da Comarca de Piracicaba, em que é apelante/apelado ALESSANDRO BENTO DA SILVA (JUSTIÇA GRATUITA), são apelados/apelantes MRV ENGENHARIA E PARTICIPAÇÕES S/A e PARQUE PARADISO INCORPORAÇÕES SPE LTDA.

ACORDAM , em sessão permanente e virtual da 3ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Não conheceram dos recursos das rés e deram provimento em parte ao recurso do autor. V. U. , de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOÃO PAZINE NETO (Presidente) E DONEGÁ MORANDINI.

São Paulo, 15 de fevereiro de 2021.

CARLOS ALBERTO DE SALLES

Relator

Assinatura Eletrônica

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

3ª CÂMARA DE DIREITO PRIVADO

Apelação nº 1004156-92.2018.8.26.0451

Comarca: Piracicaba

Apelante/Apelado: Alessandro Bento da Silva

Apeladas/Apelantes: MRV Engenharia e Participações S/A e

Parque Paraiso Incorporações SPE Ltda

Juiz sentenciante: Rogério Sartori Astolphi

VOTO Nº: 23536

DANO MORAL. VÍCIOS CONSTRUTIVOS. Insurgência das partes em face da sentença de procedência parcial. Recurso de apelação das rés. Não conhecimento. Falta de impugnação dos fundamentos da sentença. Alegações que não guardam relação com o processo. Recurso do autor. Pedido de majoração dos danos morais de R$ 5.000,00 para R$ 20.000,00. Acolhimento parcial. Imóvel novo, entregue em 2016, que apresentou trincas, rachaduras, pisos soltos e infiltrações. Falhas da construtora. Ocorrência de problemas no imóvel ao longo da demanda, que somente serão solucionados após reparação definitiva pelas rés. Inegável frustração das expectavas do consumidor. Danos morais majorados para R$ 15.000,00, com correção desde o arbitramento no acórdão e juros desde a citação. Recursos das rés não conhecidos. Recurso do autor provido em parte.

Trata-se de recursos de apelação interpostos em face da sentença de ps. 386/391, que julgou procedentes em parte os pedidos da inicial, para condenar as rés ao pagamento de danos morais em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), com correção desde a publicação da sentença e juros a contar da citação; e à obrigação de fazer consistente no dever de reparação, em liquidação de sentença, dos vícios construtivos do imóvel, mediante produção de prova pericial. Sucumbentes, as rés foram condenadas ao pagamento das despesas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa.

Inconformado, o autor apela a ps. 393/398 pretendendo, em síntese, a majoração dos danos morais para vinte mil reais.

As rés apelam a ps. 401/406 alegando, em resumo, que o imóvel teria sido entregue de maneira regular, com fornecimento de todas as informações ao adquirente a respeito da unidade adquirida, “não cabendo o argumento de que ele teria sido surpreendido pela existência de shafts em seu imóvel”; que o autor não poderia alegar desconformidade do imóvel com aquele decorado visto por ele; que a “parte Apelada expressamente aduz que as fotos do apartamento decorado que acosta aos autos para embasar o seu pedido NÃO SÃO as fotos do empreendimento em que adquiriu sua unidade”; que não haveria qualquer abalo psíquico para justificar os danos morais. Com isso, requer a improcedência da demanda ou a redução dos danos morais.

Contrarrazões foram apresentadas (ps. 414/418).

Autos em termos para julgamento virtual.

É o relatório.

De início, não se conhece do recurso de apelação das rés, pois inadmissível (art. 932, III do CPC/2015).

Com efeito, era dever das apelantes impugnar especificamente os fundamentos da sentença. Entretanto, limitaram-se a tratar de alegações que não dizem respeito ao processo.

Como relatado acima, elas fizeram alegações quanto à possível conformidade do imóvel com aquele que foi visto pelo adquirente, descabendo a ausência de informação quanto à existência de shafts na unidade imobiliária.

Ocorre que o pedido indenizatório da inicial foi pautado em vícios construtivos, na medida em que o imóvel estava cheio de trincas, vazamentos, mofo, infiltração e pisos estourando (p. 02). Inclusive, as apelantes fizeram citações que sequer diziam respeito ao processo em questão.

A sentença, por sua vez, foi expressa ao reconhecer o dever de indenizar das rés, porque esses vícios foram comprovados, conforme fotos de ps. 31/46 e declaração de testemunhas o que também não foi impugnado pelas apelantes.

Nesse contexto, o recurso apresentado é inadmissível.

O recurso do autor, por sua vez, comporta provimento parcial.

O demandante alegou que recebeu as chaves em julho de 2016 e que, logo após esse evento, foram constatados os vícios mencionados acima.

Embora a presente ação tenha sido ajuizada dois anos depois, é fato que os problemas no imóvel persistiram ao longo da demanda. Além das fotos apresentadas na inicial (ps. 31/46), o autor apresentou outras ao longo do processo, relatando a ocorrência de infiltrações no imóvel, após fortes chuvas (ps. 344/357 e 380/385).

Conforme a testemunha José, o piso da casa estava todo solto; ele confirmou a existência de trincas no imóvel e a necessidade de comprar tela para tapá-las; relatou que as trincas iam da cozinha para os quartos, subindo pelas paredes, descendo pelas janelas; que ele, na condição de pedreiro, ficou receoso de trabalhar no local, porque “o negócio estava feio”; e que tinha infiltração no imóvel, pelo lado do banheiro e do quarto.

Da mesma maneira, a testemunha Claudinei relatou em juízo que conhece o apartamento do autor, por ser vizinho dele; e que presenciou o vazamento de água por causa de chuvas e infiltrações na sala.

Além disso, não condiz com as expectativas do comprador a presença de trincas, rachaduras e piso soltando em um imóvel novo. Ainda que a avaliação desse imóvel não tenha sido feita na fase de conhecimento, essas circunstâncias acima indicam claramente a falha de construção por culpa da construtora.

Com isso, diante dos transtornos causados pelas rés e considerando que os problemas no imóvel persistirão até reparação definitiva dos vícios construtivos, a indenização fixada na origem era reduzida. Mais razoável, no caso, é a fixação de danos morais em R$15.000,00 (quinze mil reais), com correção a contar do acórdão e juros desde a citação.

Nesse sentido:

“Ação de indenização por danos morais. Danos ocasionados no imóvel da Autora, em decorrência de vícios da construção. Problemas no piso da sala e banheiro, além de algumas trincas e infiltrações por água da chuva. Questão que restou incontroversa. Reparos realizados pela construtora. Inviável a execução dos serviços com o imóvel ocupado. Autora que teve de procurar auxílio dos familiares para sair do apartamento, enquanto a obra era realizada. Expectativa da Autora frustrada ao adquirir um imóvel novo. Dever da construtora de entregar o imóvel em plenas condições de habitabilidade. Dano moral caracterizado, uma vez que a situação extrapola o mero descumprimento contratual. Montante ora fixado em R$ 15.000,00. Ação julgada procedente em parte. Sucumbência atribuída às Rés, de forma solidária. Recurso parcialmente provido.” (TJSP, Apelação nº 1004344-32.2019.8.26.0037, Rel. Des. João Pazine Neto, 3ª Câmara de Direito Privado, j. 15/10/2019 sem destaques no original).

Ante o exposto, não se conhece do recurso de apelação das rés e dá-se provimento parcial ao recurso do autor, para majorar os danos morais para R$ 15.000,00 (quinze mil reais), com correção a contar do acórdão e juros desde a citação. Diante da sucumbência das rés, majoram-se os honorários advocatícios do patrono do autor para 15% (quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa.

CARLOS ALBERTO DE SALLES

Relator