Um caso de condição análoga à escravidão foi descoberto pelo Centro de Referência da Assistência Social (Cras) e pela Polícia Militar de Barra do Garças (520 km de Cuiabá). Um homem de 43 anos e uma mulher de 49, ambos negros, foram resgatados vivendo em uma situação deplorável.
Uma assistente social e um psicólogo do Cras acionaram a Polícia Militar depois de receberem uma denúncia sobre a situação do casal, que já estava há anos vivendo como escravos em uma fazenda no Assentamento Brilhante, a cerca de 10 quilômetros de Barra do Garças.
As equipes foram até o local indicado na denúncia e encontraram as vítimas trabalhando em uma horta com a “patroa”, de 80 anos.
A idosa foi questionada sobre as acusações e se contradisse várias vezes. Ela afirmou que pagava menos de um salário mínimo aos trabalhadores, os ajudava com alimentação e moradia e que moravam no local há pouco tempo – uma das contradições, já que ela também afirmou que os dois moravam lá há anos.
Ela disse ainda que sua filha, de 58 anos, havia encontrado os dois trabalhadores em situação de vulnerabilidade e os levado para morar na fazenda.
Em conversa com a filha da dona da fazenda, ela confirmou que os dois moravam na fazenda há anos, que o homem possuía apenas certidão de nascimento e a mulher apenas o RG. Disse também que a mulher tinha direito a um benefício assistencial de um salário mínimo, mas que o pagamento era sacado pelos proprietários da fazenda.
Em entrevista, as vítimas disseram sofrer maus-tratos físicos e psicológicos, e que a mulher havia sido estuprada pelo dono da fazenda, abuso flagrado pela mulher dele, que ainda bateu nela com um facão – fato confirmado por vizinhos do local.
O trabalhador contou que a alimentação dos dois é restrita a arroz e soro de leite. Em um dia de extrema fome, ele pegou galinhas da fazenda para comer, mas foi descoberto e agredido pelo filho do casal proprietário da fazenda, que o ameaçou com uma arma enquanto o agredia.
Como os dois estavam sujos e descalços, os funcionários do CRAS questionaram quais eram as condições de higiene dada a eles e foram informados de que não recebiam nenhum produto de higiene pessoal, faziam as necessidades no mato e tomavam banho na represa da fazenda.
Eles afirmaram que nunca receberam nenhum pagamento pelo serviço prestado e que o benefício a que a mulher tem direito ficava retido com os patrões; ela apenas era levada para sacar o dinheiro.
Danos psicológicos
Devido ao sofrimento, os funcionários do CRAS e os policiais notaram que os dois tiveram danos psicológicos, não lembrando, por exemplo, a data de nascimento, suas idades, ou nome de pessoas próximas.
Consta no relatório psicossocial do CRAS que quando a proprietária da fazenda se aproximava, os dois ficavam em silêncio, nitidamente com medo.
A proprietária da fazenda e a filha foram presas e encaminhadas para a delegacia, onde um boletim de ocorrência por redução à condição análoga a de escravo foi registrado.
Uma advogada acompanhou as mulheres. O marido da proprietária, suspeito de estupro, a princípio não foi encontrado.