APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. AÇÃO ORDINÁRIA DE INDENIZAÇÃO. ATROPELAMENTO DE CRIANÇA. INVASÃO DO ESPAÇO DESTINADO AOS PEDESTRES. LESÕES GRAVES. DINÂMICA DO ACIDENTE. Hipótese em que motorista conduzia o caminhão com velocidade incompatível para a via e, ao converter à direita, sem respeitar a obrigação de parada, invadiu a calçada, atropelando a vítima que ali caminhava.
1. CULPA: A prova encartada nos autos demonstra claramente a imprudência do condutor demandado, consistente em, basicamente, três elementos: a velocidade incompatível, a ausência de cautela para a manobra de conversão e a invasão do espaço destinado aos pedestres, o que implica violação direta da norma de conduta insculpida no art. 44 do CTB. O condutor do caminhão quem tinha o dever de certificar-se acerca da possibilidade de realizar a conversão com segurança, respeitando sempre o direito de preferência daqueles que já estão transitando na via perpendicular, procedimento esse não adotado no caso concreto.
2. LESÕES: A vítima sofreu fratura na clavícula esquerda e múltiplas fraturas dos ossos da bacia, havendo laceração de pelé e de tecidos moles, atingindo o ânus, o reto e a bexiga. As perícias judiciais realizadas apontam que as lesões estão consolidadas, ocasionando sequelas definitivas de incontinência anal (decorrente da amputação do ânus), a diminuição do membro inferior direito, bem como a existência de prejuízo estético e de importante dano psíquico…. Especificamente quanto à capacidade laboral, malgrado não tenha havido a sua invalidez total, a demandante apresenta redução em grau máximo de sua capacidade laborativa, tanto pela ausência de controle do ato de defecação (que implica o uso permanente de fraldas), quanto pela dificuldade de deambulação devido ao encurtamento do membro inferior direito.
3.PENSIONAMENTO: O fato de a vítima não exercer atividade remunerada ao tempo do acidente de trânsito não obsta o recebimento da pensão mensal, uma vez que o sustento próprio não é pré-requisito para a indenização, como se lucro cessante fosse. Em verdade, a lesão a ser reparada consiste na diminuição da capacidade laboral, elemento esse que atinge tanto as pessoas já inseridas no mercado de trabalho, quanto as pessoas que ainda irão trabalhar. Art. 1.539 do Código Civil de 1916. Mantido, portanto, o pensionamento deferido no valor de um salário mínimo mensal, o que se ajusta ao grau de redução da capacidade para o trabalho delineada nas perícias médicas (grau máximo). É devido o pensionamento vitalício pela diminuição da capacidade laborativa decorrente das seqüelas irreversíveis, conquanto a vítima, menor impúbere, não exercesse atividade remunerada à época do acidente. Recurso especial conhecido e provido. (REsp 126.798/MG, Rel. Ministro CESAR ASFOR ROCHA, QUARTA TURMA, julgado em 16/10/2001, DJ 04/02/2002, p. 365).Os termos inicial e final para o recebimento da pensão – respectivamente, 18 anos e 73 anos – restam mantidos como estabelecidos na sentença, visto não ter sido alvo de insurgência de quaisquer das partes.
4. DANOS MORAIS E ESTÉTICOS: As sequelas fisiológicas são evidentes e geram imenso desconforto à demandante, que teve toda sua rotina alterada pela perda de controle do esfíncter anal, passando a necessitar permanentemente do uso de fraldas. O comprometimento estético também é notório, sendo perceptível o desalinhamento do quadril decorrente do encurtamento da perna direita, bem como pela deformidade resultante na região … impressionam as consequências psíquicas provenientes do sinistro, que alteraram o curso da formação da personalidade da vítima, a partir do evento traumático. Diante de todos esses elementos, bem contextualizados nos autos, que atingiram, sobremaneira, a integridade física e psíquica da autora, comprometendo a sua qualidade de vida para todo o seu futuro, merece ser mantido quantum indenizatório arbitrado na origem (R$ 200.000,00), como forma de reparação dos danos sofridos, já englobados o dano moral e o dano estético.No que concerne à reparação por dano moral e estético, destaca-se que ambas as parcelas são perfeitamente cumuláveis, ainda que provenientes do mesmo fato, entendimento esse, inclusive, sumulado pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula n. 387: “É lícita a cumulação das indenizações de dano estético e dano moral.”).Assim, considerando a extensão e a irreversibilidade das lesões, bem como as consequências psíquicas nefastas ao pleno desenvolvimento da vítima, entendo que deva ser mantido o valor da indenização, tal qual arbitrado em primeiro grau, como forma de proporcionar justa reparação à demandante.Diante do exposto, nego provimento à apelação, mantendo-se integralmente a sentença recorrida, nos termos da fundamentação. APELAÇÃO DESPROVIDA, POR MAIORIA. (Apelação Cível Nº 70062640628, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout, Julgado em 24/09/2015).
(TJ-RS – AC: 70062640628 RS, Relator: Ana Lúcia Carvalho Pinto Vieira Rebout, Data de Julgamento: 24/09/2015, Décima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/10/2015)